O rosto parcialmente encoberto por uma capa, o olhar faminto em busca da presa, o passo cerimonial sem produzir qualquer ruído. O diretor da escola, engolindo em seco, aperta a mão fria do pai de um aluno, que apareceu na escola sem ser convidado.

Os dois entram na sala da direção e cada um senta de um lado da mesa. Eles falam um pouco sobre o tempo que não melhora, sobre o trânsito que não anda, sobre a economia que não tem mais jeito. Em suma, sobre todos os problemas do universo, menos o que está fazendo pesar a atmosfera do ambiente.

Finalmente, o diretor toma coragem: “Então, pai, sobre o que você queria conversar hoje?”. O assunto é o filho dele, claro, o diretor já sabia. Ele não está indo muito bem em algumas disciplinas, os professores dizem que ele é bagunceiro, e ainda tem o problema das brigas em que ele andou se metendo. Algo precisa ser feito, se não ele não vai mais querer aparecer na escola.

“Veja só, pai, ele está passando por uma fase”. É, pode ser só uma fase. Afinal, ele costumava ser um ótimo aluno, nessa idade essas coisas são normais. Ele perde o interesse por algum tempo, depois volta, acontece. Repetir de ano ele não vai, isso de jeito nenhum. “Bem, se ele não vai repetir, acho que o problema não é tão grave assim, ein, seu diretor”. Exatamente, o problema não é tão grave assim.

Os dois saem da sala com a tensão controlada, pelo menos por enquanto. O diretor acompanha o pai até a saída e se despede, aliviado. Mas ao longe, ele já consegue ver: braços estendidos à frente, pés se arrastando com dificuldade, olhos sem expressão. “Lá vem outro, pronto para devorar o meu cérebro”.

 

O diretor já não sabe mais por quanto tempo vai conseguir sobreviver a esse pesadelo.